Sinta-se Em Casa

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segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

Dinamismo e Estagnação (Re-leitura de 1808 - Parte IV)

"Apesar da política de isolamento e controle por parte do governo português, a colônia era ainda mais dinâmica e criativa do que a decadente e estagnada metrópole. Isso acontecia na economia, mas também nas artes e na ciência. Entre 1772 e 1800, um total de 527 brasileiros se formou em Coimbra..."

Lisboa tinha um Príncipe Regente - D. João VI - que buscava aproveitar-se ao máximo das jogadas políticas e beneficiar-se da diplomacia com a Inglaterra. Foram muitos presentes e ofertas, e depois pagamentos pela Escolta até o Brasil. Havia tentado enganar Napoleão, conseguiu - mas, custou ao Tesouro estes agrados e promessas. Afinal, ele precisava agradar inimigos declarados. Ficou no limbo por algum tempo e queria continuar assim. 

Esta preocupação de só obter o máximo de benefícios entre arqui-inimigos, a fim de proteger a Coroa às custas do Tesouro, fez o Príncipe governar somente pra si mesmo. Portugal ficou estagnado. Aliás, foi um retrocesso porque precisava gastar, gastar, gastar como se a riqueza fosse eterna e garantida. 

Assim, não perdeu, mas canalizou muito mal aquele espírito desbravador. 

O Brasil precisava agradar somente o Príncipe, mas antes dele chegar o Rio de Janeiro e Salvador, e especialmente São Paulo e Minas Gerais mais afastados, tiveram que lutar, sobreviver, re-inventar, conquistar seu espaço, negociar entre eles, e avançaram. 

Uniu-se os conhecimentos adquiridos desta vivência com a Europa, com o desejo de "ser igual" a Europa, com a atitude e o potencial de negociar os produtos, e a decisão do Príncipe com o Livre Comércio ainda que fosse com a Inglaterra naquela altura.

Hoje tenho encontrado líderes portugueses e brasileiros com este mesmo espírito do Brasil-Colônia prestes a tornar-se independente. Gente aberta para negociar, para explorar novas oportunidades, para troca de experiências e trabalho em conjunto. 

Fashion Week dos Piolhos (Re-leitura de 1808 - Parte III)

"Carlota, as filhas princesas e outras damas da corte tinham desembarcado com as cabeças rapadas ou cabelos curtos, protegidas por turbantes, devido a infestação de piolhos que havia assolado os navios durante a viagem. Tobias Monteiro conta que, ao ver as princesas assim cobertas, as mulheres do Rio de Janeiro tiveram uma reação surpreendente. Acharam que aquela seria a última moda na Europa. Dentro de pouco tempo, quase todas elas passaram a contar os cabelos e a usar turbantes para imitar as nobres portuguesas."

Não há nada de novo. A tendência de ditar a moda em "Milão" e o resto do mundo obedecer é uma ditadura insana. 

A moda é uma arte que deve ser celebrada sem reflexão? Por que somente agora acordaram para ninguém desfilar com peles de animais? Aliás, há gente que adota um estilo de vida somente porque está na moda. Decidem ser Evangélicos porque cresce o número de artistas que o professam, assim como alguns decidem pela mesma razão apoiar o movimento LGBT. Ser evangélico, ou gay, ou usar roupas com peles de animal nivelam a ignorância contra a reflexão. 

Simplesmente reproduzir não é nada democrático, porque se alguém não segue a tendência, fica de fora. A moda inclui inside the box, e consequentemente haverá um olhar crítico para quem não está a vestir as "cores certas".

A Crítica Oficial tem o seu papel, mas exercer a liberdade tanto para reproduzir como para rejeitar precisa ser algo respeitado. 

As pessoas não valem mais ou menos porque vestem isto ou aquilo. O bom-senso cabe a todos, sempre, em todo canto. 

E neste sentido sentimo-nos mais livres em Portugal. Há uma certa simplicidade na maneira de ser. Não vemos uma atitude de ostentação. Aliás, a tendência de ostentação do brasileiro está em muito relacionada com os artigos cuja "etiqueta" vem "de fora", ainda que seja "Made in China". Isto lembra a época de alguma Carlota?

Esta liberdade também deveria acontecer com outras escolhas. Existe uma "ditadura da oposição". Respeitar e amar aqueles que pensam diferente também deveria servir aos que defendem as minorias. A minoria pode ter voz, mas é tão agressiva quanto os xenófobos quando impõe respeito desrespeitando.  

Somos livres para concordar e para discordar. O mundo seria tão saudável se cada um não fosse perseguido por suas escolhas, seja ela da minoria ou da maioria. 

Deixa-me tocar num ponto polêmico. Os pais devem respeitar os filhos? Sem dúvida. A Bíblia ordena aos pais que não irritem aos seus filhos para que eles não desanimem. Por outro lado, é preciso lembrar que os filhos devem-lhes respeito e honra. 

Como já disse o poeta: "Você diz que os teus pais não entendem você, mas você não entende seus pais." Percebem que é preciso haver respeito e honra? Um equilíbrio que não faz mal a ninguém.

Por outro lado, há diferença entre princípios básicos de saúde relacional e moral, e escolhas mais pessoais como uma profissão a seguir. Ainda assim, o diálogo sempre é o melhor caminho. Diálogo com o coração aberto para dar e receber.

Se assim agirmos, não cairemos nas imposições que mais castram e sufocam que trazem liberdade. 

"Beija-mão"e Carnaval (Re-leitura de 1808 - Parte II)

A família Real fez uma escala em Salvador antes de chegar ao Rio de Janeiro, depois de exaustivos 3 dias e pouco de viagem. 

"Não vem ninguém de terra?" Questiona o D. João VI - o Príncipe Regente. João Saldanha da Gama - o então Governador - justifica ter impedido o povo a fim que tivesse primazia. Ao que contesta polidamente o Príncipe: "Deixe o povo vir como quiser, pois deseja ver-me". 

"...À noite, a comitiva real se recolheu ao Paço do Governo. Seguiu-se uma semana de música, dança, espetáculos luminosos pelas ruas da cidade e longas cerimônias de beija-mão, nas quais o príncipe regente recebia, pacientemente, filas intermináveis de súditos..."

O Brasil nasceu neste contexto de festa, muita festa, honrarias ao Príncipe, nem que seja somente para "tirar uma selfie" - ou melhor, um "beija-mão". 

As coisas mudaram? Nem no Brasil, nem em Portugal. 

Faz parte da alma brasileira "paparicar" tudo que é europeu e aumenta a impressão que gostam os portugueses da posição de colonizadores. Parece que ficou no "inconsciente coletivo". 

Esta postura subserviente é castradora porque é mentirosa. Os dois lados trazem razões que merecem ser honradas, e coisas a serem reprovadas. 

E a festa? É uma maravilha perigosa, que pode alucinar. Sabemos "beber-com-moderação"? Que o diga nossos carnavais. 

terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

Não Poderia Ser Mais Rico? (Re-Leitura de 1808 - Parte I)

Como não admirar e enaltecer o caminho das Índias com Vasco da Gama, e consequentemente a imensa riqueza dos Lusíadas de Camões? 

Quem não se inclinaria frente ao "Mar Salgado" de Fernando Pessoa, bem como ao respeito a tantas mães e noivas que cá ficaram a salgar os mares dos Descobrimentos?

Por outro lado, enquanto a América do Norte proclamava sua Independência e acontecia a Revolução Francesa, Portugal continuava atracado ao estilo de vida da Inquisição. "Não saiu da Península um único homem superior, que se possa colocar ao lado dos grandes criadores da ciência moderna." (Antero de Quental) 

Afinal, depois de tantos Descobrimentos e Conquistas  PORTUGAL NÃO PODERIA SER MAIS RICO E PODEROSO do que tudo que é hoje? (Ainda que seja um país fantástico pra se viver.)

Explorar, usufruir e desfazer era a filosofia. Portugal vivia e se deleitava num estilo de vida e cultura extrativista e mercantilista, enquanto os países em grande desenvolvimento avançavam com a manufatura. Criar a partir dos produtos explorados era uma tarefa para os ingleses, os maiores beneficiários das riquezas vindas do Brasil via Portugal.

O livro 1808 de Laurentino Gomes ajuda-me a entender porque os portugueses são "bilíngues", e porque ainda vivem tanto com recursos que vêm de fora  - talvez isto explica a nova febre tão bem-sucedida do Turismo. Eles sabem fazer bem aquilo que os outros preferem pagar.

Seria por isto que há tantos Projetos e Iniciativas sustentados pelo "estrangeiro" (como se diz por cá)? 

As Igrejas também refletem esta tendência? Os missionários estrangeiros são a mão-de-obra barata da manufatura que é preciso produzir nos campos de Portugal? "Produzir" através dos missionários - inclusivamente "produzir" missionários - também é tarefa do "estrangeiro"? 

Graças a Deus que há um remanescente português sendo despertado e que traz à tona aquele espírito de conquista, e cuidadoso para não perder os bens desta bravura. E ademais, com uma atitude ir além...