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sábado, 11 de dezembro de 2021

Nos Bastidores da Hospitalidade

Comer bem e dar boas risadas! Esta era a minha vivência ao redor da mesa. Foi assim em família e também no contexto de Comunidade Cristã brasileira.

A hospitalidade era oferecer o melhor, ainda que o melhor não fosse o que tínhamos. Eu preciso confessar: não havia simplicidade no sentido de oferecer só o que podíamos oferecer. O frugal não cabia no prato da Hospitalidade.

Eu vim de uma realidade onde comer era o mais importante quando o assunto era comer. Faz sentido? E um detalhe a mais: vivia eu na cultura Paulista onde, normalmente, era deselegante passar horas nas casas das pessoas, mesmo dos amigos (com raríssimas exceções). Havia um certo limite. Fazia parte do bom senso a certa altura pedir licença, e ouvir por educação: "não vai não, está cedo!" (Ainda que fosse tarde!)

Entretanto, tenho descoberto uma coisa linda na cultura portuguesa: o valor do convívio. Os portugueses passam horas ao redor da Mesa. Diga-se de passagem que "conviver" no Brasil aplica-se ao cotidiano, e cá em Portugal é "convívio", aquele encontro mais alargado ao redor da mesa.

O que acontece ao redor da mesa? Quais as implicações da Hospitalidade?

Edith Schaeffer em seu livro "L'Abri" partilha os bastidores da Hospitalidade desde o trabalho da decoração até o enfrentamento de situações bastante delicadas, e sobretudo um mergulhar profundo de alma e de tempo em aconselhamento, reflexão e oração.

É isto que temos vivido na Associação Evangélica Cascatas. A Hospitalidade traz desdobramentos mais profundos e a frugalidade encontra o seu espaço. Aliás, a simplicidade do prato único especial é algo da cultura portuguesa. A cultura do Banquete e do "self-service" com muitas opções de prato torna a Hospitalidade mais complexa.

E o que acontece num Centro onde as pessoas vêm para ficar? Fazer uma refeição e passar o dia é o menos comum. Normalmente, as pessoas ficam dias e até meses.

Então, floresce a oportunidade de Confissões, Sessões de Aconselhamento, Discipulado, Estudos Bíblicos, Reflexão, Trabalho manual e tempo de oração.

O que vivi em 19 anos de pastorado foram situações que demandavam atenção especial e depois cada um ia para casa, e então marcava-se alguns encontros mais. Num Centro de Hospitalidade há um aprofundamento quantitativo concentrado tanto no ouvir quanto nos temas estudados. Os encontros não são semanais, eles acontecem diariamente, e algumas vezes por algumas vezes no mesmo dia.

Enfim, as fotos ao redor da Mesa não revelam os bastidores da Hospitalidade. As fotos não contam as confissões e as curas, nem as melhores piadas e as lágrimas mais dolorosas, nem mesmo as privações e os milagres da multiplicação, nem ainda a abnegação aguda e as dádivas que algumas vezes são traduzidas em presentes e mimos.

A Mesa, a horta, as criações, a cozinha, o jardim de oração, a lareira, os filmes, os jogos e as brincadeiras, e até os passeios e as caminhadas, são instrumentos que nos tornam mais vulneráveis, e quando abrimos as Escrituras estamos mais receptivos.

Depois de mergulhar neste Ministério vejo que se não houvesse boa base familiar, boa teologia, conhecimento bíblico, vida com Deus e muita disposição e disponibilidade em servir como Cristo serviu aos discípulos, e ainda abertura em receber bem todo tipo de gente, este Centro não passaria de uma Guest House. 

Uma Guest House se safa com uma camareira, uma cozinheira e um manager, no entanto, um Centro de Hospitalidade - para além destes - ora requer um pastor, ora um professor, ora um psicólogo, ora um irmão, um pai ou uma mãe, ou um servo, ou simplesmente um igual, um ser humano, gente que precisa Deus, gente que precisa de gente.

Instagram: @vacilius.lima